terça-feira, 14 de julho de 2009

TENHO DITO

Diante desse abismo todo
Dessa página em branco
Esse tédio lancinante
Retira do meu pensamento
A possibilidade de escrever.

Meus dedos insistem
Nessa aventura malograda
Nessa batalha inglória
Contra esse enfado instalado
Nas estalactites do meu pensar.

Essa caverna antes florescente
Iluminada pelas lanternas do poema
Experimenta nessa hora finda
O amargor dessa escuridão entediante
E o silêncio mórbido do vazio.

Busco as expressões simplórias
Como solução para essa desventura.
Os adjetivos comuns
As orações menos complexas
Os verbos mais usuais.

Qualquer lampejo de inspiração
Ou mesmo suor de transpiração
Mais não encontro nada!
As palavras são estranhas pra mim
Os textos... Um monte de rabiscos.

Como se por obra do divino
Nesse instante minha mente sofre de amnésia.
De um esquecimento involuntário
Dos termos pontuais
Das vírgulas... crases... reticências.

No obscuro da madrugada
Na penumbra transitória do dia que se anuncia
Almejo caído pelo chão algum escrito
Uma frase repetida
Ou um sentido qualquer para registrar.

Qualquer receita perdida
Ou bilhete deixado na estante
Quem sabe uma carta esquecida?
Preciso de um elemento qualquer
Onde a palavra seja decifrada.

Como as alternativas cessaram
Procuro então vocábulos nas melodias clássicas
Esquadrinho versos nos quadros renascentistas
Pesquiso discursos efusivos no silêncio mudo
Encontro poesias apaixonadas na chuva que cai.

Tudo vai se encaixando num livro encantado
Não fruto de inspiração ou transpiração
Simplesmente na magia do observar com os sentidos
Que na falta das palavras
Busca na desarmonia da vida
A razão de escrever.

joasvicente